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domingo, 5 de fevereiro de 2012

DESENVOLVIMENTO TURÍSTICO E SEUS EFEITOS – PARTE I




Alex Pongitori Silveira é um acarauense apaixonado pela sua terra e formado em Turismo pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Professor e Coordenador dos cursos de Guia de Turismo e Hospedagem da EEEP Marta maria Giffoni. Acredita, com todas  suas forças, que o Turismo ainda vai mudar, pra melhor, a realidade de nossa cidade. E é colunista aos domingos do Blog de Notícias Acaraú, Vivendo e Sempre Aprendendo!


DESENVOLVIMENTO TURÍSTICO E SEUS EFEITOS – PARTE I

Nosso país apresenta excelentes perspectivas para desenvolvimento do turismo. Assim como nossa cidade. São diversos biomas, ecossistemas, grandes parques de patrimônio cultural, que permitem que destinos sejam estruturados à partir disso. Sendo assim, a atividade torna-se muito importante no que diz sentido de desenvolver a economia local, especificamente nos destinos que não contam com tantas iniciativas econômicas.

O retorno econômico advindo do desenvolvimento turístico em Acaraú pode ser bem significante, gerando emprego e renda, e diversificando a economia. Contudo, se o esquema da coisa não for feito da maneira correta, a atividade volta-se contra a comunidade e muitos dos efeitos negativos advindos de má gestão são difíceis de se reverter.

Como já disse em outro momento, para que o turismo tome estabilidade efetivamente e de forma sustentável, é vital que haja a participação da comunidade local. Somente à partir de um processo participativo a construção de políticas públicas eficientes se torna mais fácil. Além disso, é importante sermos conscientes de que o turismo não é um “herói” que vem pra salvar a todos, embora possa sim contribuir positivamente para o progresso de nossa querida cidade.

E por qual motivo falo disso!? Duas semanas atrás, comentei sobre a legalização da profissão Turismólogo e do meu descontentamento de presidenta Dilma ter vetado artigos que versavam sobre quem seria esse profissional alegando que, segundo a Constituição, em seu art. 5o, inciso XIII, assegura o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, cabendo a imposição de restrições apenas quando houver a possibilidade de ocorrer algum dano à sociedade. No artigo em questão, pontuei vários impactos negativos causados pela má gestão do turismo e hoje, retomarei o tema sendo mais abrangente no assunto.

- Efeitos Socioeconômicos

Só é possível entender os efeitos socioeconômicos do turismo quando identificamos que, na maioria dos casos, a atividade se dá de forma natural, de livre vontade.  Para clarificar a informação posso usar como exemplo o carnaval de Acaraú, já que ele está cada vez mais próximo. Entendam que se trata de um exemplo de caráter explicativo apenas, contextualizado com nossa realidade, mas fictício, Inicialmente, esse evento era frequentado apenas, ou em sua grande maioria, pela população acarauense, mas, com o passar do tempo, tornou-se conhecido, surgiram alguns turistas que passaram a identificá-lo como atrativo e, de forma natural, o carnaval vem sendo freqüentado por bastante gente de fora.

Ao mesmo tempo que ela estava tornando-se conhecida, a área onde o evento acontecia foi alterada, para dar espaço para mais pessoas participarem do mesmo; alguém da comunidade montou uma estrutura para vender bebidas e comidas no local; outras pessoas montaram barracas com o mesmo intuito; algumas outras passaram a alugar suas casas para turistas interessados em aproveitar o evento.

O lixo produzido da atividade acumulava-se ao longo dos dias e não era limpo; a presença de turistas atraiu gente de má índole que passaram a realizar furtos; a população flutuante inflou a cidade e, por conta disso, a rede de água e esgoto não suportou; a cidade não preparou-se para a demanda de energia por conta do evento. O evento, sem segurança, sujo e sem energia afastou as pessoas e quando as autoridades se deram conta o carnaval de Acaraú já era sinônimo de “ruim” pelas cidades vizinhas, sua imagem estava degradada.

O exemplo contempla uma sucessão de impactos negativos gerados a partir do crescimento desordenado do turismo, especificamente num evento. Pensem agora no seguinte panorama: e se todos os atrativos (sejam em potencial ou consolidados) fossem utilizados com o mesmo descaso? Praias, mangues, lagoas, enfim. Em pouquíssimo tempo todo o meio ambiente estaria desvirtuado e por conseguinte, haveria uma série de males sociais. São impactos como esse que surgem quando a atividade turística se desenvolve de forma desordenada, sem que haja o planejamento das autoridades ou sociedade.

Impactos socioeconômicos negativos do turismo:

1)    Crescimento do custo de vida: como fluxo de turistas, gerando uma maior movimentação no comércio e setor de serviços, os proprietários de alguns empreendimentos vêem nisso a oportunidade de aumentarem seus lucros, aumentando seus preços. Na maioria dos casos o turista tem um maior poder aquisitivo e pode pagar por isso, ainda que continue sendo imoral, mas os residentes, que também usam parte desses serviços e compram nos mesmos lugares que os turistas, acabam sendo lesado.

2)    Incapacidade de atendimento dos serviços públicos: o turismo tende a desenvolver-se muito mais rápido do que a capacidade dos serviços públicos tem de crescer em resposta. São necessários anos para ampliação de vias, saneamento básico, abastecimento de água e energia, ente outros. Uma cidade com população de 5 mil habitantes vai entrar em colapso quando, nas férias de fim de ano, sua população flutuante for de 7,5 mil e o serviço público continuar conseguindo atender apenas seus residentes.

3)    Êxodo rural e de outras atividades: o êxodo rural é uma realidade brasileira, quando o turismo é o motivador desse êxodo a coisa se agrava, já que os trabalhadores rurais, especialmente os jovens, vêem no turismo uma oportunidade de melhoria de vida e remuneração. A conseqüência disso é que as comunidades agrícolas tendem a entrar em declínio e a cidade passa a ter que buscar fora os hortifrutigranjeiros. O turismo acabaria gerando uma “manocultura” econômica, se houver queda brutal do fluxo turístico, haverá falências em massa, o que vai causar um grande problema de desemprego na cidade.

4)    Migração regional: os residentes das cidades do entorno daquela que se desenvolveu turisticamente também vêem nesse crescimento uma oportunidade. O excesso de gente, que tenta no turismo uma melhoria de vida, e por vezes não consegue, acaba indo morar em áreas periféricas da cidade, gerando ou agravando um problema urbano chamado de favelização.
5)    Adensamento populacional e urbanização: a questão é bem simples. Cresce o número de turistas, cresce o processo de urbanização dos territórios. Praias desertas passam a ter casas de veraneio, pousadas, hotéis, entre outros. Gerando uma extensão da cidade para novos núcleos.

6)    Periferização das cidades e especulação imobiliária: o turismo gera valorização dos terrenos próximo aos atrativos. O que acontece é que, normalmente, imobiliárias, ou residentes com condições, compram esses terrenos de comunidades tradicionais e as vendem muito mais caro para turistas e investidores. Os moradores que venderam seus terrenos, por vez, não conseguem comprar bons terrenos e acabam instalando-se nas periferias da cidade.

7)    Uso de drogas, tráfico e criminalidade: o aumento da urbanização, a migração e a periferização das cidades com talento para o turismo têm efeito específico sobre o aumento da criminalidade. A marginalização social destes processos se contrapõe diretamente com a existência de turistas “ricos”, crescem, assim, os assaltos e furtos. O uso de drogas e o tráfico acaba sendo uma outra consequência disso tudo.

8)    Redução da qualidade de vida: é claro que diante de tantos impactos negativos a qualidade de vida da população local acabe sendo danificada.

9)    Fuga da economia: com o turismo espera-se que grandes empreendimentos gerem muitos empregos, o que de fato é verdade; contudo, se não houver mão-de-obra qualificada na região, esses empreendimentos optará por trazer de fora muita gente para ocupar essa demanda, restando à população sub-empregos. A renda que poderia circular pela cidade acaba indo para gente de fora.

10)    Sazonalidade: o que acontece é que na alta temporada há o excesso de turistas nas cidades, gerando sobrecarga de muitos serviços como foi apontado até aqui, já na baixa temporada, há o ócio de boa parte desses negócios. Como conseqüência a cidade sofre com prejuízos e falências que em conseqüência geram desemprego. Toda a comunidade sofre, ora há o excesso de gente, ora o esvaziamento e suas consequências; as prefeituras que tem que lidar com esses problemas e, por fim, os turistas que acabam indo embora com uma má imagem do destino.

Contudo, como dito anteriormente, se bem desenvolvido, e de forma sustentável, o turismo pode gerar muitos benefícios socioeconômicos.

O pleno desenvolvimento turístico pode trazer à cidade muitos empregos, especialmente quando os empreendimentos podem usar a mão-de-obra local, por esta adequar-se aos seus parâmetros de qualidade. Além disso, todas as atividades correlatas ao turismo acabam indiretamente crescendo também.

Há o surgimento de empresas, o crescimento de outra e com isso o fomento à arrecadação municipal, que, quando bem administrado, volta isso na forma de benefícios à população, como melhoria da segurança, dos serviços de saúde e educação, entre outros. O resultado disso é a melhoria da qualidade de vida dessas pessoas.

E se a cadeia produtiva do turismo for fortalecida em torno de pequenos proprietários de hotéis, restaurantes e outros empreendimentos, é mais certo que a renda advinda disso seja bem melhor distribuída do que em modelos onde existem grandes empreendimentos. 

Na semana que vem continuarem falando o tema, especificamente sobre os efeitos socioculturais dessa realidade.

Alex Pongitori
Turismólogo 

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